MÚSICA NA BARÃO

Roberto Stepheson
E-mail: professordemusica@yahoo.com.br

Este texto é parte integrante de minha dissertação de mestrado[1], sendo esta um relato de experiência musical e uma investigação dos processos de ensino-aprendizagem musical envolvidos na formatação, execução e resultados do trabalho de música realizado em uma instituição de ensino da rede pública do Município do Rio de Janeiro, Escola Municipal Barão de Santa Margarida[2]. Para tanto, foram abordado aspectos como identidade e pluralidade cultural, autonomia, efeitos psicológicos, papel da música no espaço escolar e interdisciplinaridade. O projeto teve relevância por propiciar oportunidades ao educando e por reconhecer e aproveitar suas potencialidades, suas competências, estimulando-o a criar, a participar, permitindo ainda que desenvolvesse seu senso crítico, auto-estima, assumir-se como sujeito responsável pela sua própria transformação e do seu meio fomentando, assim, práticas socioeducativas.

Assim é a música: ao te libertar, prende-te ainda mais.
BERNT VON HEISELER


Não vem, não vem que não tem
Na escola da vida eu sou nota 100
Não vem, não vem que não tem
Você pode não acreditar
Mas eu já sou alguém
ALUNOS DA BARÃO


Considerações iniciais

A Arte pode ser um veículo de transformação. Como exemplos desse alcance, podemos mencionar o Olodum e Timbalada, na Bahia, e o AfroReggae, no Rio de Janeiro, que hoje são reconhecidos internacionalmente e desenvolvem importantes projetos sociais em suas comunidades.
Aliada à Educação, a Arte é mais um recurso para motivar, envolver, integrar e manter o aluno na escola, além de contribuir para a formação do cidadão. Invoca “aspectos essenciais da criação e percepção estética [...] e o modo de tratar a apropriação de conteúdos imprescindíveis para a cultura do cidadão contemporâneo” (BRASIL, 1998a, p. 19).
Por esse caminho, constata-se que a “dimensão social das manifestações artísticas revela modos de perceber, sentir e articular significados e valores que orientam os diferentes tipos de relações entre os indivíduos na sociedade” (ibidem, p. 19). A arte permite ainda que o educando perceba, compreenda e relacione esses significados, pois tal entendimento “inclui modos de interação como a empatia e se concretiza em múltiplas sínteses” (BRASIL, 1998a, p. 19).
Com uma convivência sadia e contínua, o relacionamento professor-aluno avança –positivamente – e gera ganhos para ambas as partes. Porém, muitas vezes os educadores desconhecem o que se passa com o aluno. Talvez por falta de tempo, disposição, condições satisfatórias de trabalho, burocracia, agigantamento da máquina escolar ou ainda despreparo dos professores e instituições escolares. E algumas das situações e atitudes tomadas por esses profissionais afetam diretamente à aprendizagem e futuro do discente, tanto para o sucesso como para desfechos insatisfatórios.
Não estamos dizendo que o sucesso ou fracasso do ensino depende exclusivamente do professor. Claro que não. O que há, sim, é um conjunto de mecanismos e situações que incidem nos resultados finais e que passam pelo número de docentes, condições adequadas, planejamento, comprometimento, investimentos e políticas públicas[3] que se façam cumprir.
Mas é essencial, segundo Afonso (2001, p. 87-88), que tanto os docentes como os discentes, “tenham todas as condições para poder reconstruir quotidianamente o sentido de uma escola promotora das aprendizagens e dos saberes que são imprescindíveis a uma participação ativa, digna e com espírito crítico, numa sociedade cada vez mais complexa”.
Constata-se isso em ocasiões como os Conselhos de Classe, quando um professor, por desconhecimento e talvez por falta de oportunidade devido à excessiva carga horária e número elevado de estudantes na sala de aula, recomenda a reprovação de um aluno. Nomeia-o de faltoso, amparado pelo cabal e indiscutível registro no seu diário de classe, que mostra claramente suas faltas subseqüentes ou esporádicas, além do seu baixo desempenho escolar.
Mas outro professor, que esteve mais próximo desse aluno, devido à convivência informal dos passeios e ensaios de música, descobre que ele passa por sérios problemas financeiros ou de doença familiar, e por isso ausentava-se da escola.
O aluno nem sempre tem iniciativa e coragem para chegar à escola e falar de seus problemas particulares, como a escola também não tem a iniciativa de ir até ele. Até porque, muitas vezes nessa linha tênue, não há espaço e alternativas nesse sentido, além de que a escola, a priori, não pode assumir o papel da família.
Dando um exemplo dessa inter-relação escola-aluno, por vezes inseparável, o professor das Oficinas de Música da Barão Marcos Melo lembra o seguinte episódio:

Certo dia, eu estava no pátio da Escola e vi uma das alunas das oficinas muito triste, praticamente chorando. Fui ao seu encontro e lhe perguntei o que estava acontecendo. Ela me respondeu que seu pai havia morrido poucas horas atrás, por negligência médica. E que a Escola, naquele momento, era o único lugar onde ela se sentia realmente amparada.[4]

O professor, em outro exemplo, fica abismado ao ver um aluno, tido por ele e pelos demais colegas como fraco, em alta desenvoltura, se destacando em uma apresentação musical ao vivo em um teatro ou principal casa de espetáculos da cidade. Inevitavelmente, ele se pergunta: Como pode? Logo aquele aluno de baixo rendimento, que quase sempre tira notas baixas? E pensa: como poderei reprová-lo agora? Ele se mostrou uma pessoa especial e muito importante para a escola. É talentoso, atua como se fosse profissional, tem iniciativa e atitude ao encarar uma platéia de 2.000 pessoas com destreza e naturalidade. Enfim, tem competências que eu desconhecia e que muitos aspiram em tê-las e não conseguem[5].
Não é raro ver alunos que têm total aversão e dificuldade em ir à frente da turma para falar, ler um texto, expressar-se e até mesmo tirar dúvidas com o professor. Quanto mais cantar, se apresentar e se expor em um palco.
As experiências que a música traz para o aluno, ao lidar com situações que exigem autocontrole, ao lhe permitirem aflorar, usar e controlar as emoções, ao elevarem sua auto-estima, possibilitam algumas transformações: enfrentar adversidades, transpor o medo, a timidez, a ansiedade.  Por isso, ele torna-se mais seguro na tomada de decisões, não somente na música, mas na sua vida, aspectos essenciais para uma estabilidade psíquica.
É notória a ação da música. A ciência já demonstrou que ela exerce influência na mente, no corpo e no comportamento de pessoas de todas as idades, pois “movimenta, mobiliza, e por isso contribui para a transformação e para o desenvolvimento” (GAINZA, 1988, p. 36). Para Piaget, o desenvolvimento psíquico

[...] começa quando nascemos e termina na idade adulta, é comparável ao crescimento orgânico: como este, orienta-se, essencialmente, para o equilíbrio. Da mesma maneira que um corpo está em evolução até atingir um nível relativamente estável – caracterizado pela conclusão do crescimento e pela maturidade dos órgãos –, também a vida mental pode ser concebida como evoluindo na direção de uma forma de equilíbrio final, representada pelo espírito adulto (PIAGET, 2006, p. 13).

No trabalho de Educação Musical/Educação Artística[6] da Barão, observou-se o entrelaçamento de questões levantadas nesta pesquisa, principalmente a prática voltada ao fazer musical – experimentação, criação, composição coletiva –, contextualização, dentre outros aspectos relevantes no processo educacional atual, como o resgate à auto-estima, valorização da cultura brasileira, além de anseios socioeducativos, como o respeito, a cidadania e o desenvolvimento físico-mental do educando.
Cada vez mais estamos vivenciando um mundo de distâncias encurtadas, globalizado, onde as longínquas culturas ressaltam e nos fazem perceber a rica diversidade que está à nossa volta. Com o surgimento da grafia musical, por exemplo, pudemos ter acesso às músicas de gênios como Bach, Vivaldi, Mozart e Beethoven. Desconhecer e se fechar seria quase que impossível, e certamente um equívoco.
Havemos, sim, de nos aperceber de tudo isso, ou pelo menos tentar, e então traçar rumos que valorizem não somente um único universo cultural. Trazer experiências da pluralidade cultural se faz necessário para que possamos “conhecer e respeitar diferentes linguagens” e, enfim, estabelecer “atitudes de diálogo e respeito para com culturas distintas” (BRASIL, 1998b, p. 156).
Nos tempos de hoje, sobretudo com a popularização dos meios de comunicação e de aparatos tecnológicos, contribuímos e levamos também nossa cultura a lugares até então impensáveis: o maracatu pernambucano, a capoeira, o pagode e o funk carioca, por exemplo, já extrapolaram suas fronteiras regionais e, mais ainda, do Brasil.
Comungando com idéias do pesquisador Small (1999), podemos dizer que os alunos da Barão tinham – e ainda têm – o “dom” para música e, sendo assim, compartilharam uma linguagem comum, mesmo que em muitos momentos embrenhados no regionalismo, também já universalizado. Na verdade, o que se fez foi simplesmente garantir um espaço e dar oportunidades.
O ritual da música na Escola/comunidade foi deixá-la fluir, fosse um funk, hip hop, maracatu, jongo, bumba-meu-boi, samba, samba-reggae, misturas rítmicas, improviso, música experimental ou o que pudesse surgir naqueles frutíferos momentos.
A jornalista Renata Petrocelli escreve a respeito do trabalho de música desenvolvido na Barão, e traz depoimentos de alunos e professor que traduzem o que acabamos de expor:

Outro bom exemplo vem da Barão de Santa Margarida, que também tem uma história de vitórias no FECEM[7]. O trabalho de música, coordenado pelos professores Roberto Stepheson, Marcos Melo e Claudia Valéria, mobiliza os alunos o ano inteiro. A empolgação é tão grande que eles freqüentam a escola aos sábados para os ensaios. “É muito melhor estar aqui que na rua, sem ter o que fazer”, opina Aparecida da Conceição Oliveira, de 15 anos. Seja nas aulas de música ou nas oficinas que a escola promove, os alunos aprendem ou aprimoram seus conhecimentos em dança, canto, percussão e instrumentos musicais, além de investirem em ritmos apontados por eles próprios. “O importante é abrirmos um espaço para que eles mostrem o que sabem. Muitas vezes, o que apresentam nem foi aprendido com a gente. Muitos já vêm com uma bagagem musical grande e temos de estar atentos a isso”, reflete Roberto Stepheson (PETROCELLI, 2006b, p. 42).

Em outra reportagem, escreve:

Levar para a escola as experiências e gostos musicais dos alunos pode ser uma forma de promover sua auto-estima e ainda ensinar-lhes conceitos como o respeito à diversidade e a importância da escuta e da troca de experiências. São estes os princípios que norteiam o trabalho de educação musical desenvolvido na Escola Municipal Barão de Santa Margarida, 9ª CRE, pelos professores Roberto Stepheson e Marcos Melo (idem, 2006a, p. 31).

A profª. Sônia Almada[8], no programa de TV Nós da Escola gravado com os alunos e professores de música da Barão em 2004, descreve um trabalho realizado de iniciação à escrita e de prática musical. Em entrevista concedida ao apresentador do programa, diz:

Os alunos, numa prática real e imediata, através de palmas ou batida com os pés no chão, estão vivenciando o pulso, tempo básico na música. Essa vivência se dá tanto sonoramente quanto na representação do silêncio. E o professor vai iniciando à leitura simultaneamente, movimento corporal e a representação escrita dessa execução. Aí, a leitura flui naturalmente. É interessante observar que o professor utiliza os instrumentos musicais. Essa atividade vai estimular e desenvolver a capacidade criadora dos alunos. Ele está num jogo musical e na improvisação. E vai aproveitar essa atividade [...] para o acompanhamento de uma melodia (ALMADA, 2004).

A profª. de Matemática da Escola Claudia Valéria, que se engajou ao projeto de música praticamente no seu início, relata com propriedade o que acontecia na Escola:

A música também gera uma mobilização no ambiente escolar, e nesta mobilização percebe-se que são as diversas capacidades e fraquezas individuais que, somadas, dão o resultado do trabalho. É um exercício social intenso, onde o resultado é conquistado pela integração de muitos. Dessa forma, é desenvolvida é uma sensibilidade para perceber o tempo do outro, para se afinar com o outro, assim como os instrumentos musicais. A música o incita (aluno) a agir de modo consciente, criativo, e através dela os processos do dia-a-dia são vivenciados de uma forma artística e a qualidade das relações é revelada[9]. (Parênteses nosso)

Uma estratégia adotada foi a de ressaltar e integrar os alunos mais experientes. Estes, além de terem um espaço para continuar e explorar suas aptidões musicais, puderam contribuir para o projeto com suas práticas, ajudando na musicalização dos alunos novos. De outra forma, poderiam passar despercebidos e talvez o grupo não chegasse ao patamar que chegou, lembrando os bons resultados obtidos.
Viu-se claramente essa situação na Barão quando um dos alunos ganhou o prêmio de melhor instrumentista na etapa final do FECEM 2005[10]. O garoto, que tocou congas[11], ao ingressar na Escola já apresentava boa desenvoltura musical. O papel dos professores de música na ocasião foi “achá-lo” e incluí-lo no trabalho. Ganhou-se um bom músico que, a partir de então, ajudou na musicalização dos demais, pois houve de fato aprendizagem, troca de experiências, tanto com os professores como entre os próprios alunos, e elevação do nível musical do grupo. Imaginemos, pois, quantos talentos há em uma escola da Mangueira, da Serrinha, de Madureira e de outras comunidades notórias do samba carioca.
Outro exemplo foi de um aluno da Barão que tocou no saxofone alto o Hino Nacional Brasileiro, na abertura do FECEM 2007[12]. Ele já apresentava um excelente nível musical antes de ingressar nas oficinas, pois tocava em eventos evangélicos e seu pai também era saxofonista e músico profissional. Rapidamente se integrou e contribuiu significativamente para o bom desempenho do grupo no Festival e em apresentações.
Mais um ponto a ser ressaltado é que inicialmente procurou-se trabalhar dentro do universo e dos gostos musicais dos alunos para, aos poucos, expandi-lo. Um pouco antes se trabalhou o funk, que era um gênero apreciado pela maioria dos alunos à época; em 2004 o samba e o maracatu; em 2005 o hip hop e o bumba-meu-boi; e em 2006 trabalhou-se o jongo, que é um gênero praticado no Rio de Janeiro, principalmente na Serrinha e em outras comunidades rurais e urbanas do Estado.
Em 2007 foi realizado um festival interno na Barão, e a música que venceu representou a Escola na etapa regional do FECEM, na Lona Cultural de Campo Grande, e na etapa final, na UERJ. A música era um samba, e foi composta, letra e música, por uma aluna do 8º ano. Na Escola, foi ensaiada e apresentada por um grupo de alunos, com acompanhamento ao violão de um dos professores de música. Depois foi refeito o arranjo, entrando mais instrumentos, como o saxofone alto, flauta transversa, teclado, tantans, congas, pandeiros, surdo, chocalho e vozes, sendo uma cantora solista e três meninas nos vocais. Venceu a etapa regional, foi gravada em estúdio e depois apresentada na etapa final do Festival, ganhando o prêmio de melhor letra.
O ensino musical aplicado nas Oficinas de Música era em grande parte prático: experimentar, ouvir, ver e fazer. No entanto, foram dadas aulas de escrita e leitura musical, principalmente à introdução dos elementos de escrita[13] (básico), estes sempre atrelados à prática musical, conforme exemplo dado anteriormente no depoimento da representante da SME para o programa de TV Nós da Escola (cf. p. 76).
E boa parte dos alunos tinha aulas de Educação Musical nas turmas regulares, o que reforçava o trabalho. No entanto, como eram apenas dois professores da disciplina na Escola, nem todas as turmas foram assistidas.
A abordagem da escrita musical ocorria, sobretudo, nas oficinas de flauta doce, violão/cavaquinho e percussão, que era realizada quando se fazia necessário complementar o entendimento do assunto em questão. Em algumas turmas da oficina de percussão, a professora Claudia Valéria introduziu também o método O Passo[14], ampliando o trabalho prático-teórico.
Ainda na oficina de percussão, os professores explanavam as células rítmicas dos ritmos estudados, que eram dispostos – escritos com caneta pilot – nos ladrilhos da parede da sala de música, que se somavam aos trabalhos de grafitagem realizados pelos alunos (cf. 3.3.4.3). No entanto, eram mais ilustrativos do que propriamente dito explicativos, pois o foco das oficinas era mesmo o fazer musical. Na oficina de violão/cavaquinho o professor trabalhava ainda a cifragem musical e na oficina de flauta o professor passava tarefas e exercícios escritos para que os alunos pudessem praticar na sala e em casa.
Uma parcela dos alunos, porém, já tinha uma prática musical adiantada ao chegar às oficinas, principalmente os que participavam de grupos musicais evangélicos e de religiões afro-brasileiras. Esses alunos, inicialmente sentiam e exteriorizavam suas diferenças religiosas. Mesmo assim, as experiências musicais que traziam eram válidas e compartilhadas com todos.
E eles logo se entrosavam, deixavam as diferenças de lado e participavam ativamente das atividades propostas pelos professores, fosse um samba, maracatu ou funk. Procurava-se sempre deixar claro que o enfoque era eminentemente o musical, independente de a música ou gênero musical ter origem ameríndia, branca, negra ou de celebrações religiosas, como foi o caso do maracatu[15] e até mesmo do samba[16], oriundo dos batuques e manifestações/festas de terreiro[17].
Assim como os alunos que externaram hostilidade, alguns responsáveis, inicialmente, proibiram seus dependentes de participarem das oficinas devido às questões de cunho religioso que acabamos de mencionar. Mas após dialogarem com os professores e tomarem conhecimento do projeto, reviram suas decisões. Houve até mesmo tutor que passou a incentivar seu filho, enteado ou tutelado e passou também a assistir as apresentações sempre que possível.
Constata-se, assim, que o trabalho de Educação Musical realizado na Barão permeia algumas das questões levantadas na presente pesquisa, principalmente sobre a convivência, o respeito às diferenças, a valorização do educando em seu meio e, em acréscimo, a valorização da cultura brasileira.


Descrição do projeto de música

O trabalho de música na Barão realizava-se de duas maneiras: aulas em turmas regulares e em Oficinas de Música, que aconteciam uma vez por semana, com um ou dois tempos de aula, 50 minutos cada tempo.
Para nossa pesquisa, avaliamos somente o trabalho desenvolvido nas Oficinas de Música e Dança, apesar de muito do material e atividades temáticas produzidos nas oficinas terem sido aproveitados também nas aulas regulares, como o bumba-meu-boi, funk, hip hop, jongo, maracatu e samba, tanto na disciplina de Educação Musical como nas outras disciplinas da Escola.
Todas as aulas oferecidas nas oficinas eram gratuitas e em turno oposto ao que o aluno freqüentava na sua série regular. A não ser quando se marcava aula extra ou ensaio geral, realizados geralmente ao meio-dia, à tarde perto do final das aulas ou no final de semana para que alunos dos dois turnos pudessem participar e para se formar um grande grupo.
As oficinas eram atividades voltadas principalmente para a prática musical em conjunto, onde os alunos tinham à disposição as seguintes possibilidades de participação: percussão (agogô, atabaque, caixa, chocalho, conga, pandeiro, pratos, repique, surdo, tantan, tamborim, entre outros), coral, flauta doce, violão e cavaquinho. As aulas de flauta doce duraram somente dois anos, pois havia poucos freqüentadores e os professores preferiram priorizar as oficinas mais procuradas, como as de coral e de percussão.
Cada professor conduzia sua(s) oficina(s), que eram realizadas em separado e variavam em número de alunos, dependendo da procura e do espaço disponível. No início não havia uma sala de música[18], e usava-se a sala de leitura, o pátio interno, o refeitório, a quadra, o pátio da casa da moradora da Escola ou qualquer sala de aula que estivesse disponível no momento. Numa sala de aula comum não caberiam todos os alunos, os instrumentos musicais e não haveria espaço suficiente para o grupo de dança realizar evoluções.
De todos os alunos que passaram pelas oficinas, 44% foram da oficina de percussão, 32% da oficina de coral, 13% da Oficina de Dança, 9% da oficina de violão/cavaquinho e 2% da oficina de flauta[19]. Do ano de 2004 ao ano de 2007, conforme dados fornecidos pela Direção, 5.332 alunos matricularam-se na Escola: 1.289 em 2004; 1.367 em 2005; 1.296 em 2006; e 1.380 em 2007. Observe-se que, no resultado final, os números são aproximados, pois alguns alunos foram transferidos ou abandonaram os estudos. Desse contingente total, 12% passou pelas Oficinas de Música e de Dança.
No entanto, segundo a profª. Claudia Valéria, durante os quatro anos esse quantitativo foi bem maior “devido as participações que ocorriam nos ensaios abertos e atividades que eram promovidas com freqüência pelas oficinas na Escola”[20].
Ela cita como exemplo as atividades do bumba-meu-boi, jongo e hip hop. No bumba-meu-boi, alunos assistiam aos ensaios na quadra, dançavam, brincavam com o Boi e com as máscaras dos Cazumbás[21]. No jongo, foram realizadas rodas abertas à participação de quem quisesse, tendo interagido também professores e funcionários.
No hip hop, vários alunos participaram de atividades de desenho, grafitagem e de dança promovidas pelos professores das oficinas com a colaboração dos professores Demartone Gomes[22] e Elder Sodré[23]. Aproveitou-se, inclusive, parte dos dançarinos para atuar junto ao grupo de música, tendo-se, inclusive, descoberto alunos com boa habilidade para a dança e artes plásticas, advinda dessa cultura urbana.
O projeto das Oficinas de Música aconteceu devido à necessidade de se intensificar e melhorar o trabalho de música na Barão. Foi construído e solidificado paulatinamente no decorrer dos quatro anos com as respostas obtidas e experiências adquiridas, amoldado por seus professores e colaboradores. Tinha como propósito maior um trabalho de prática musical junto aos alunos da instituição, atendendo as suas necessidades e aproveitando tanto as proficiências dos docentes ministrantes como as habilidades dos discentes.
Procurava, no entanto e à medida do possível, contemplar pontos relevantes do Projeto Político-Pedagógico da Escola[24], que embora tivesse como prática promover tais ações pedagógicas, não adotava a Pedagogia de Projetos[25]. Estes vinham da iniciativa de seu corpo docente, como foi o caso dos professores de Educação Musical, Direção ou mesmo da 9ª CRE e/ou SME.
Procurando assegurar o bom desenvolvimento do projeto das oficinas, normas foram acordadas para que houvesse comprometimento com o trabalho, bom convívio entre os participantes e busca de melhoria, não somente nas oficinas, mas também na Escola no que diz respeito à conduta e à aprendizagem. Freqüentando assiduamente as aulas – das oficinas e regulares – o aluno, por exemplo, melhoraria seu desempenho. Eram elas:
  • A partir da 4ª falta consecutiva haveria a perda da vaga.
  • Somente poderia participar das oficinas o aluno que tivesse boa freqüência e razoável desempenho escolar[26]. Ao perder a vaga, só poderia retornar no ano seguinte. Para isso, teria que fazer novamente a inscrição, submetendo-se aos prazos e limites de vagas.
  • Era suspenso por um breve período[27] o aluno que apresentasse problemas de indisciplina nas oficinas, na sala de aula regular, nos passeios, apresentações e/ou nos demais domínios da Escola, que compreendia os corredores, pátios, quadra e calçada da parte externa. Aluno que reincidisse na indisciplina era suspenso por um período maior ou, dependendo da gravidade do ocorrido, perderia a vaga.

Todavia, antes da aplicação de qualquer tipo de sanção, os professores procuravam conversar com o aluno para averiguar o porquê do ocorrido, e então decidiam sobre as medidas cabíveis. Se necessário, conversavam com os outros colegas e/ou com o responsável pelo aluno. Eram constantes ainda as prosas sobre postura adequada, respeito, compromisso com o projeto, com a Escola, e cuidados com os instrumentos musicais, principalmente quando se juntava o grande grupo ou quando ocorriam situações, que eram de imediato repartidas com todos.
A Oficina de Dança surgiu um pouco depois de o projeto ter início, quando se trabalhou a atividade temática maracatu. Percebeu-se a possibilidade de incluir a dança, assim como é comumente empregada no maracatu pernambucano, fonte de inspiração tanto do tema como da estética do trabalho desenvolvido. Mas o interesse pela dança já era observado nos eventos promovidos na Escola, ou mesmo nas aulas de música. Nos ensaios realizados na quadra, eram vistos alunos dançando nos arredores, principalmente meninas.
Vale ressaltar que inicialmente houve a ajuda das professoras de Educação Física[28]. Mas depois as próprias alunas se reuniam, assistiam a vídeos, ouviam músicas do gênero, montavam as coreografias e ensaiavam, utilizando um pouco mais à frente músicas compostas pelos alunos das Oficinas de Música.
Sobre essa experiência, as professoras da Escola Maria Manoela Faleiro e Dilma Barrozo comentam:

O que mais me chamou a atenção foi isso, de ver aquelas minhas crianças, que nunca tiveram essa motivação, ali realizando esse trabalho, dançando, principalmente no maracatu, as meninas me procurando pra gente ensinar. E quando eu vi aquilo, eu me emocionei, tanto na parte da dança quanto na parte da música.[29]
[...] as meninas se envolveram. Elas gostam daquilo, elas dançam. No conjunto, a coisa fica muito bonita, quando você vê o ritmo com a letra, com a apresentação das meninas. Quando entra o boi, então, é uma coisa maravilhosa. É um todo.[30]

A partir de então, a nova oficina, conduzida pelos próprios alunos, engajou-se no projeto e não mais parou. No primeiro momento, participavam somente meninas. Depois vieram os meninos no hip hop, bumba-meu-boi e jongo. Todavia, a Oficina de Dança acontecia somente a partir do segundo semestre, quando as músicas das atividades temáticas já estavam prontas ou em construção e o grupo de dança se juntava ao grupo de música.

Professores envolvidos

Após participar de dois festivais promovidos pela Rede Municipal de Educação do Rio de Janeiro[31] (em 2002 e 2003), e também devido aos resultados positivos logrados nos dois eventos[32], iniciou-se no ano de 2003 um movimento dos professores e alunos da Escola para dar continuidade ao trabalho, porém com mais estrutura, organização, e não somente direcionado ao Festival, que acontecia apenas uma vez por ano.
Em 2004, após discussão entre os professores, elaboração do projeto, negociações e aval da direção da Escola[33], o Projeto Oficinas de Música da Barão finalmente teve início. Participavam, à frente do trabalho, os professores Roberto Stepheson e Marcos Melo, ambos professores de Educação Musical da Barão, e a profª. Claudia Valéria, que lecionava Matemática. Todavia, a idéia de criar as oficinas partiu do prof. Demartone Gomes.
Nas Oficinas de Música, o prof. Roberto Stepheson[34] ministrava aulas de flauta doce, percussão e coral, regia o grupo, tocava flauta transversa, teclado e percussão, e conduzia os alunos nas apresentações, gravações e passeios; o prof. Marcos Melo[35] ministrava aulas de violão, cavaquinho, percussão, tocava violão e percussão no grupo, e conduzia os alunos nas apresentações, gravações e passeios; e a profª. Claudia Valéria[36] ministrava aulas de percussão, tocava percussão no grupo, fazia o registro fotográfico e de vídeo, e conduzia os alunos nas apresentações, gravações e passeios.
Para que tudo acontecesse, os professores das oficinas e seus colaboradores se reuniam em muitos momentos, na Escola ou em outros lugares, para troca de informações e discussão de idéias e ações que deveriam ser tomadas para colocar em prática o projeto.
O professor Demartone, que além de lecionar História na Barão, toca violão e outrora tocava e cantava em bares do bairro de Campo Grande nas décadas de 1980 e 1990, participou do grupo de percussão, juntamente com o prof. de Geografia Altair Caetano, que tocou em escolas de samba da cidade na década de 1980 e o prof. de Ciências André Luís, que é músico profissional desde a década de 1970. O prof. André participou ativamente da formulação do projeto das oficinas e tocou percussão, teclado e cavaquinho no grupo. Em 2005, a profª. de Língua Francesa Miriam Machado, que na faculdade (década de 1980) cantava em corais, se integrou ao grupo de professores das oficinas, ajudando nos ensaios, apresentações, passeios e fazendo versões para a língua francesa de algumas das músicas compostas pelos alunos.
Participaram também, por um breve período, entre seis e dez meses, o prof. de Educação Física Sérgio Alan[37], tocando percussão e conduzindo o grupo nas apresentações; prof. de Educação Musical Jerônimo Sérgio[38], ministrando aulas de cavaquinho e teatro; e prof. Renato Peres[39], ministrando aula de teatro.
A Oficina de Teatro não entrou na avaliação da pesquisa, pois aconteceu em breves momentos e, por falta de professor, não teve continuidade. No entanto, a performance teatral esteve presente nas músicas e apresentações do grupo em vários momentos.

Objetivos

Os objetivos que se seguem[40] foram elaborados pelos professores Roberto Stepheson, Claudia Valéria, André Luís e Marcos Melo, na etapa de preparação para a implantação do projeto, que aconteceu no final do ano de 2003 e início de 2004. Tiveram como propósitos nortear o trabalho das oficinas e estabelecer metas a serem alcançadas, sem, no entanto, ditar regras em demasia, o que cercearia a proposta inicial do trabalho – troca de experiências e o fazer musical – e/ou inviabilizaria o projeto, que visava também envolver os participantes. A saber:
·         propiciar ao educando a aprendizagem em instrumentos musicais diversos e canto coral a partir de uma prática de conjunto participativa, inclusiva, levando-o, com isso, a uma formação mais ampla;
·         aproveitar, ressaltar e incentivar talentos que, muitas vezes, passam despercebidos pela Escola, e também proporcionar o ingresso na música de outros interessados que ainda não tiveram a devida oportunidade, ou que até então não atentaram para tal arte;
·         ajudar a manter o aluno na Escola, tendo em vista a evasão escolar devido, principalmente, ao desinteresse, à falta de perspectivas futuras, e construir nele, através de práticas saudáveis de convivências contínuas, anseios socioeducativos norteando-o dentro e fora do ambiente escolar; e
·         pesquisar, divulgar e reproduzir manifestações culturais brasileiras, contribuindo para a divulgação da cultura musical e artística na E. M. Barão de Santa Margarida.

Além dos acima estabelecidos, outros objetivos foram listados para o Projeto Oficinas de Música da Barão:
  • fomentar a prática através do fazer musical, sustentado pela experimentação, improvisação e criação;
  • proporcionar condições e espaço para a troca de experiências entre os professores e alunos; entre os próprios alunos; e entre os alunos, professores e músicos convidados;
  • estabelecer compromisso com o trabalho de música e com a Escola;
  • gerar motivação, prazer e envolvimento; e
  • contribuir para o fortalecimento da auto-estima e da autonomia do educando, no sentido de que possa, sozinho, crescer musicalmente, ou que possa ainda buscar mecanismos que lhe permitam isso.

Início e desenvolvimento das oficinas

Após a elaboração e de acertos promovidos no projeto no final de 2003 e início do ano letivo de 2004, lançou-se, ao final do mês de março e início de abril de 2004[41], a proposta das Oficinas de Música na Barão.
Foram colocados avisos em murais e cartazes espalhados por todo o prédio. Em outro momento, os professores diretamente envolvidos passaram em todas as salas para dar explicações mais detalhadas, como os dias das aulas, horários, funcionamento, dinâmica e locais, bem como tirar dúvidas sobre o que seriam as oficinas e como participar delas. O recolhimento de inscrições foi realizado em três períodos – fevereiro/março, maio e agosto –, pois se fazia necessário estabelecer um comprometimento por parte dos interessados para com o trabalho.
Devido aos resultados obtidos nos FECEMs de 2002 e 2003, espécie de embriões das oficinas, houve uma substancial procura dos alunos, que foram direcionados às oficinas de coral, flauta doce, violão, cavaquinho e percussão.
As aulas aconteciam uma vez por semana, sendo pela manhã para alunos que estudavam no turno da tarde, e à tarde para alunos que estudavam no turno da manhã. Dessa forma, os alunos teriam mais oportunidade de participar, caso tivessem disponibilidade e interesse.
As primeiras aulas foram mescladas com ilustrações de músicas em fitas cassete, CDs, vídeos e acesso à internet. Procurava-se empregar, dentro das possibilidades, tudo que pudesse ajudá-los a perceber o universo musical/cultural em que adentrariam.
Nada mais instigante do que assistir vídeos, por exemplo, de apresentações do grupo de percussão Stomp – que usa materiais alternativos e se destaca também pela performance corporal – ou apresentações de alunos da própria Escola, ou ainda ver na internet e ler sobre grupos de maracatus do Ceará e de Pernambuco, realidades distantes e diferentes, até então, para eles.
Inspirados no grupo Stomp, materiais de sucata diversos foram adquiridos, pois inicialmente havia poucos instrumentos de percussão, sendo eles um pandeiro, um surdo pequeno, um tantan, um agogô e um chocalho, adquiridos com a ajuda dos professores da Barão. Mais adiante a Escola disponibilizou verbas para a compra de instrumentos musicais e aparelhagem de som.
Nas audições, os alunos puderam trazer músicas para escutar na sala e depois discutir sobre elas: aspectos musicais e de contextualização inseridos. A preferência era por funk e rap, estilos que estariam presentes nas composições e repertório das oficinas. Mas eles trouxeram, além de funk e rap, um repertório eclético, com pagode, música gospel, reggae, música clássica (erudita) e gêneros e artistas da MPB, como Djavan, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Lulu Santos, entre outros.
Primeiramente, os professores colocaram que, para serem respeitados em seus gostos musicais, seria preponderante que também respeitassem os gostos dos outros. Depois se iniciou a audição com as músicas trazidas por eles.
Alguns alunos, inicialmente, se sentiram tímidos ou intimidados em mostrar aos colegas que gostavam de música clássica ou gospel. Ficavam preocupados em mostrar também algumas de suas músicas para os professores, principalmente os “proibidões”[42], coisa que para eles não era novidade e sim para os educadores que provavelmente só escutassem esse tipo de música na TV e no rádio por conta da intensificação dos meios de comunicação e da mídia.
E, da mesma forma que eles mostraram suas músicas, os professores, numa troca, mostraram as suas, independente de serem melhores ou piores, situação irrelevante na atividade. A partir dessa dinâmica, foi possível trabalhar diversos gêneros e estilos musicais, como choro, frevo, forró[43], funk, marcha, maracatu, rap, rock e samba.
Sobre esse tipo de atividade que acabamos de relatar, trazemos a fala do pesquisador e Educador Musical Murray Schafer, particularmente dirigindo-se a um grupo de alunos em 1964:Certamente não estou dizendo que vocês devam gostar de tudo o que ouvem ou vêem. Somente um tolo faria isso. Estou simplesmente dizendo que quem quiser descobrir música interessante terá que procurar e achar. É a mesma coisa que ir à biblioteca” (SCHAFER, 1991, p. 24).
A ponderação de Schafer é pertinente, pois estabelecer uma prática de escuta diversificada, e não somente um tipo de música de determinado grupo ou mídia, era exatamente um dos focos das Oficinas de Música. Buscava-se usufruir dos desdobramentos dessa experiência e, mais importante, desfazer as barreiras do preconceito musical – e como desdobramento religioso e/ou social – comumente enraizado nas pessoas.
Muitos dos alunos já possuíam boa habilidade musical. Integraram-se rapidamente e contribuíram auxiliando aos demais, como se fossem monitores. Dessa forma, houve um crescimento musical do grupo, incentivo aos novos, além da valorização desses alunos mais experientes.
Nas aulas das Oficinas de Música, os procedimentos consistiam em levantamento de repertório, técnicas adequadas e ações específicas para cada uma, sendo elas:
  • iniciação à técnica vocal e canto de repertório popular diversificado para o coral;
  • sopro, posicionamento dos dedos e execução de peças e/ou trechos musicais compatíveis para flauta doce;
  • posicionamento dos dedos, levantamento de acordes e execução de peças compatíveis para violão e cavaquinho; e
  • manejo de baquetas e macetas, toques de mãos e técnicas específicas para cada tipo de instrumento de percussão.

Um pouco à frente, a composição foi acrescida ao trabalho de música, priorizando temas relevantes ao processo educacional: cidadania, identidade, violência, poluição, drogas e relação professor-aluno-escola, retirados das discussões fomentadas e surgidas nas oficinas, do Projeto Político-Pedagógico[44] e da vontade de se abrir espaço para esses enfoques.
As técnicas não foram metódicas, e sim laboratoriais; ou, melhor dizendo, troca de experiências entre professores e alunos, com improvisações, experimentações sonoras e outros recursos.
No início de cada aula os alunos da percussão tocavam à vontade, exploravam e escolhiam livremente os instrumentos musicais sem a intervenção do professor, para que, de forma espontânea e prazerosa, pudessem fazer descobertas. Nas aulas de coral, flauta e violão, os alunos traziam sugestões de músicas para serem ouvidas, utilizadas como playbacks e incorporadas ao repertório.
Foram abordadas noções preliminares de teoria musical. Todavia, esta seria mais introdutória e básica, pois sempre se procurou evidenciar a prática: o fazer musical. Fazendo uma analogia, podemos dizer que aprendemos primeiramente a falar, e só depois é que dispomos dos recursos da escrita e da aprendizagem formal escolar.
E isso se aplica também ao ensino da música. Primeiro se aprende a tocar um instrumento, depois é que se parte para o entendimento dos signos e significados da escrita musical. Notação esta que, segundo Swanwick (2003, p. 59), “é uma forma de análise, e que qualquer análise é, necessariamente, parcial e incompleta”.
Ainda em 2004, os alunos das oficinas tiveram a oportunidade de conhecer vários lugares e pessoas de referência no cenário musical. Visitaram o Theatro Municipal do Rio de Janeiro e assistiram ao concerto didático da Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB)[45]. Após o concerto, lancharam numa pizzaria do Centro da cidade. Visitaram a Capela Magdalena e assistiram ao concerto didático do cravista e maestro Roberto de Regina – nesse dia, os alunos cantaram e tocaram um funk para o maestro, em retribuição à sua gentileza e hospitalidade; assistiram também aos shows didáticos na Lona Cultural de Campo Grande do cantor Ataulfo Alves Júnior – com direito à participação dos alunos da oficina de percussão –, do grupo de dança e música Rio Maracatu; da harpista Cristina Braga; e do renomado percussionista Reppolho.
Houve ainda um lanche na residência de um dos professores de música da Barão, após apresentação do grupo no Colégio Pedro II, e um piquenique dominical no Campo de Santana, Centro do Rio de Janeiro, onde os alunos lancharam, tocaram, cantaram e passearam livremente, juntamente com os professores das oficinas e de outras disciplinas presentes: enriquecimento cultural e construção de relações dentro e fora da Escola.
Com os passeios e apresentações, além da aprendizagem não-formal, os alunos tiveram outros ganhos significativos: incentivo para continuar, pois puderam ouvir e ver de perto músicos profissionais cantando, executando seus instrumentos, e puderam dialogar com alguns deles; união, pois estavam juntos nas aulas, nos ensaios, nos passeios, e assim foram se conhecendo cada vez mais e conhecendo os professores, agora seus parceiros; e substancial melhoria da conduta em locais públicos, pois os problemas ocorridos eram debatidos. Quando pertinente, os professores se faziam presentes, primeiramente conversando, depois chamando a atenção, e só então suspendendo de um passeio ou apresentação. E isso só foi conseguido devido, principalmente, ao grau de envolvimento e interesse.
O grupo não estava de todo pronto – nos referimos agora como grupo a junção de todas as Oficinas de Música –, pois o repertório ainda estava sendo preparado e os alunos tinham pouco tempo de prática. Mas as apresentações se iniciaram.
Primeiro foi um convite da Associação de Moradores de Santa Margarida para participar da inauguração do Ecoponto[46] do bairro, e depois um convite da 9a CRE para participar do tradicional Desfile Cívico no Centro de Campo Grande, juntamente com as escolas da bairro, por conta das comemorações cívicas de 7 de Setembro.
Na inauguração do Ecoponto houve a participação do coral e do grupo de percussão. No Desfile Cívico, enquanto as demais escolas apresentaram-se com seus instrumentos musicais, o grupo de percussão mostrou uma performance inusitada com sucata: latas, tambores plásticos, garrafas de vidro e de plástico, canos de metal, molas de carro, tampas de panelas, escorredor de macarrão e outros utensílios que pudessem produzir sons, mesclados com instrumentos convencionais, os poucos de que o grupo dispunha.
A falta de instrumentos foi solucionada com muita criatividade e vontade de participar. Certamente foi diferente, inesperado e, no entanto, agradou à platéia, principalmente aos convidados do palanque de autoridades. O grupo surpreendeu também tocando, além de marcha (militar), outros ritmos como funk, samba e samba-reggae[47].
O grupo da oficina de percussão se apresentou ainda no evento O Corpo Fala[48], utilizando o próprio corpo (palmas e batidas de pés) e materiais de uso diário da escola, como cabos de vassouras, copos e pratos plásticos que habitualmente utilizavam na merenda escolar. Nessa apresentação, destacou-se ainda a participação da Dona Therezinha[49] dançando forró e do Sr. José Balbino Alves[50] tocando sanfona juntamente com o grupo: envolvimento com a comunidade.
E aconteceram apresentações na quadra da Unidos de Santa Cruz[51], Lona Cultural de Campo Grande Elza Osborne (diversas vezes), Fundação Unificada Campograndense (FEUC)[52], Semana Cultural do Colégio Pedro II[53] e auditório Palácio da Cultura Gustavo Capanema (MEC). Neste último, o grupo de música e dança se apresentou no XIII Encontro Nacional da Associação Brasileira de Educação Musical (ABEM)[54].
Por isso, os talentos natos e recentes afloravam, contagiando todos e impulsionando os alunos a melhorarem musicalmente, artisticamente e também de continuarem nas oficinas. E a cada apresentação o grupo crescia em qualidade, companheirismo e, inevitavelmente, em quantidade. Juntava-se ao grupo professores de outras disciplinas da Barão, confirmando a musicalidade fértil do lugar, tanto por parte dos discentes como dos docentes.
É pertinente salientar a disposição da Escola em permitir e incentivar esse tipo de iniciativa, fato não muito comum, pois implica em trâmites burocráticos, políticas educacionais, escassez de verbas, questões administrativas, além de espaço físico. E também da 9a CRE, pelos elogios que incentivaram o grupo a crescer, convites para apresentações com o devido amparo e pelo suporte no que diz respeito à ajuda no transporte, na compra de instrumentos musicais, além de outras contribuições.
Com o aumento expressivo do número de participantes surgiu um problema inesperado, mas iminente: o grupo iria participar do FECEM 2004, na Lona Cultural de Campo Grande e todos os alunos das Oficinas de Música juntos não caberiam no palco. O que fazer?
Por estarem trabalhando a música para o Festival em que o ritmo era um maracatu pernambucano, e por terem visto o grupo de música e dança de maracatu, surgiu a idéia de empregar parte dos participantes do coral – que era em maior número e que tinha muitas meninas – em um grupo de dança, para desafogar o espaço e evitar cortes.
Muitas das meninas aceitaram a proposição de imediato. A dança é inerente e está presente constantemente em suas vidas, seja nos bailes, na TV e na própria Escola. E com ajuda de professores, começou-se a ensaiar e a montar coreografias. Nascia assim a Oficina de Dança.
Na apresentação, o coral e instrumentistas ficaram no palco, e as dançarinas se apresentaram abaixo dele. Foi uma junção perfeita: expressão musical e corporal concatenadas. Deu certo, agradou e o grupo obteve o 1o lugar no Festival.
Além da música Maracatu do lado de cá, o grupo apresentou no mesmo Festival o Samba do lápis e caderno no compasso, que teve atuações teatrais, com uma situação hipotética de sala de aula, onde os alunos batucavam nas mesas e uma aluna se passava por uma professora autoritária e estressada: expressão musical, teatral e corporal também concatenadas.
Durante os ensaios para o Festival foram realizados mini-shows. O grupo de música saía da sala de ensaio e se dirigia às salas de aula onde os colegas estavam estudando, para mostrar as músicas compostas e interpretadas por eles.
As apresentações fizeram bastante sucesso entre os alunos e professores: adoraram, aplaudiram, identificaram-se. Depois se podia escutar as músicas sendo assobiadas e cantadas pelos corredores da Barão. Contudo, por conta do volume dos instrumentos e da empolgação, o grupo de música atrapalhou um pouco as aulas. Mas os professores das demais disciplinas entenderam a proposta e apoiaram a iniciativa.
A essa altura, praticamente toda a Escola já estava envolvida, pois cada vez mais professores – de Línguas, Matemática, Geografia, História, Ciências – e funcionários participavam e ajudavam de alguma forma, dentro de suas possibilidades e vontade: uns se juntaram ao grupo para tocar e cantar – despontaram também talentos musicais e artísticos entre os professores e funcionários –, outros costuraram e doaram roupas para o grupo de dança, ajudaram nos ensaios e na arrumação da sala de música, deram apoio nos passeios e apresentações, na gravação e edição de vídeos, na confecção de cartazes e torcida nos festivais. Deram ainda ajuda financeira para o transporte dos instrumentos em muitas das apresentações, compra de materiais diversos, de lanches quando o grupo saía para se apresentar e compra de instrumentos musicais.[55]
E então, em prol do bem comum, algumas atividades interdisciplinares surgiram espontaneamente, como a que foi realizada em 2005, onde se tomou como eixo o Estado do Maranhão: História fez pesquisas históricas, Geografia explorou localidades, Educação Física realizou atividades físicas e de danças, Ciências utilizou explicações de fenômenos locais e efeitos especiais, Matemática trabalhou formas geométricas, e Música trabalhou as músicas do bumba-meu-boi nas aulas regulares, além do grupo de música nas oficinas.
No bumba-meu-boi, os professores puderam dar sugestões e produzir algo na sua matéria a partir do tema gerador, assim como ajudaram nas outras disciplinas e no Boi da Barão[56], que se apresentou em diversos lugares, sempre levando com entusiasmo o nome da Escola.
No ano anterior foi realizada uma mostra de arte[57] na Lona Cultural de Campo Grande, onde os alunos e professores de várias disciplinas expuseram e apresentaram trabalhos de poesia, desenho, música, teatro e de dança realizados nas oficinas e nas salas de aula regulares.
Para a profª. Claudia Valéria, a mobilização em torno das atividades das oficinas mostrou aos professores da Barão que juntos trabalhavam melhor. Aspecto este – união do grupo – destacado pelos professores entrevistados. Especificamente na sua disciplina, ela nos dá o seguinte depoimento: “Trabalhar nas oficinas me influenciou positivamente na relação com os alunos durante as aulas de Matemática” [58].
Sobre o desdobramento da interdisciplinaridade na sua disciplina, a profª. Miriam Machado comenta: “Cantar em francês com os alunos fora da sala de aula foi uma experiência interessante. Incentivou-me a continuar usando a música como mais um recurso nas aulas. Há uma melhor assimilação tanto do vocabulário quanto da pronúncia da língua estrangeira em estudo” [59].
Outra ação realizada foi a ligação do aluno com a sua freqüência e desempenho na Escola. O propósito não era punir ou excluir quem apresentasse notas baixas, faltasse ou tivesse comportamento impróprio. Mas trabalhou-se no sentido de acompanhá-lo e instigá-lo para que pudesse melhorar cada vez mais, não só nas oficinas, mas também na Escola, em seu desempenho nas demais matérias e no companheirismo com seus colegas. Alguns desses resultados positivos foram logrados.
Com as oficinas em andamento, os professores Roberto Stepheson e Claudia Valéria aproveitaram parte do material para criar em março de 2005 uma página (site) e disponibilizá-lo na internet[60]. Foram publicadas explicações sobre as oficinas, letras de músicas, fotos, gravuras (grafites e desenhos produzidos), depoimentos dos alunos e professores, partituras, músicas em midi e MP3 e materiais temáticos trabalhados[61].
Com isso, conseguiu-se divulgar o trabalho que estava sendo realizado, e os alunos tiveram a possibilidade de acessar o site no laboratório de informática da Escola, em lan houses ou em suas residências, para os que dispunham desse recurso. Como o laboratório estava em fase de implantação, o conteúdo do site foi copiado diretamente nos computadores (off-line[62]) para pesquisas e visitas. Algumas das aulas de Música (turmas regulares) foram programadas para o laboratório. Com isso, os alunos sentiram-se valorizados e contentes em participar do projeto.
Trabalhando em conformidade com os Projetos Político-Pedagógicos da E. M. Barão de Santa Margarida (“Identidade cultural da comunidade”, em 2003/2004; “Cidadania e a tecnologia e mídia a serviço do cidadão”, em 2005/2006/2007), procurou-se ressaltar e valorizar a cultura do aluno, seu cotidiano e seu meio, além do esforço de procurar inseri-lo nas novas conquistas sociais e tecnológicas.
Com preceitos como inclusão, integração e interdisciplinaridade, saídos da teoria e fomentados a partir da música, foram gerados, além da aprendizagem musical propriamente dita, contínuo aumento de participantes, aumento da auto-estima, visão crítica e demais pontos imprescindíveis ao crescimento artístico, intelectual e social do alunado em questão.
No período em que aconteceram as oficinas, os alunos se apresentaram em escolas, faculdades, teatros, casas de espetáculos conceituadas da cidade, participaram de gravações de CDs[63] e vídeo[64], recebendo muitos elogios e apoio para que continuassem o trabalho.
Alguns dos alunos, inclusive, nunca tinham saído do bairro. Todavia, se apresentaram na Reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Escola de Música da UFRJ, Academia Brasileira de Letras (ABL), Palácio da Cultura (MEC), Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), ATL Hall[65], Colégio Pedro II e em vários outros lugares, o que foi motivo de empolgação e satisfação para os que tiveram a oportunidade de participar das apresentações e de conhecer lugares significativos (cf. Anexo N).
Dessa forma, o reconhecimento em participar de um projeto que os valorizavam, o auto-reconhecimento de suas aptidões, o aprendizado, a ampliação cultural e o prazer de estar na Escola emergiram. As experiências adquiridas, relevantes em suas vidas no que diz respeito à aprendizagem – mais ampla – e formação de cidadania, ficarão guardadas para sempre em suas memórias. Como bem ressaltam os professores das oficinas, “cada um de nossos alunos poderá olhar e refletir sobre o passado, vivenciar plenamente o presente e ter esperança no futuro” [66].


Processo composicional e atividades temáticas

No processo de composição/criação, os alunos da Barão participavam ativamente, sugerindo os ritmos/gêneros musicais, como foi o caso do samba, funk e hip hop, e ainda sugestões de temas e palavras ressaltadas da experiência de vida de cada um. Desse trabalho, criavam-se glossários e a partir deles os alunos podiam experimentar, agrupar e rimar muitas das palavras para elaboração de frases que, paulatinamente, incorporaram-se à letra da peça musical.
Com a letra pronta, partia-se para a melodia e, finalmente, para o ritmo, harmonia, introdução, instrumentação, canto, arranjo, que aos poucos eram melhorados nos ensaios periódicos.
O ato de compor é um momento em que podemos rever o que foi apreendido, juntar o aprendizado às expectativas, ao material a ser manejado, às experiências vividas, e então celebrar as descobertas que se seguirão advindas desse ato que tem propósito e sentido próprio, quer se chegue a uma peça musical bem estruturada e acabada ou mesmo a um simples contorno rítmico-melódico  que  desencadeará  uma gama de possibilidades.  Pois, como afirma  Schafer (1991, p. 307), “música é algo que soa. Se não há som, não é música”.
As músicas elaboradas nas oficinas tinham como princípio básico conglomerar idéias, aptidões, e era uma extensão das atividades temáticas promovidas pelo projeto. Durante os quatro anos, foram compostas coletivamente cinco músicas – conforme ilustradas logo abaixo (título das músicas) –, compostas a partir dessas atividades, além de outras compostas individualmente pelos alunos e/ou ramificações destas. Vejamos:

  • Samba do lápis e caderno no compasso
  • Maracatu do lado de cá
  • Turma do gueto
  • Boi da paz
  • Olha o jongo aí!

O foco principal eram as experiências e aprendizado em grupo, e obedecia a sete etapas bem definidas, como veremos a seguir:
1) Escolha do tema: Os professores reuniam-se, geralmente no final e/ou início do ano letivo, para escolher o tema que seria aplicado no período[67].
2) Levantamento de material: Escolhido o tema, os professores juntavam material necessário para aplicar no projeto e promover trabalhos de pesquisa com os alunos. Eram utilizados livros, revistas, textos de diversas fontes e materiais de áudio e vídeo.
3) Encontros audiovisuais e atividades de pesquisa: De posse do material, primeiramente os alunos ouviam gravações, assistiam a vídeos e depois faziam atividades de pesquisa para que pudessem adentrar de fato no tema que seria trabalhado. Nessa etapa, realizada em um ou dois encontros, usava-se a sala de aula comum, laboratório de informática e biblioteca/sala de leitura da Escola. Os professores passavam também tarefas de pesquisa para os alunos fazerem em suas residências e trazerem ao encontro seguinte para compartilhar com os demais colegas e professores.
4) Criação da letra da música: Realizadas as etapas anteriores, os professores iniciavam a dinâmica de aula, que consistia em pedir aos alunos que suscitassem o máximo possível de palavras que tivessem relação com a  proposta levantada – pesquisadas anteriormente –, para que fossem escritas no quadro-negro. Depois pediam que formulassem frases com essas palavras. Nesse momento nenhuma frase era descartada, mesmo que mal formulada ou incompleta. Depois eram apagadas algumas palavras do quadro e se escreviam todas as frases montadas. Do lado direito do quadro-negro ficavam somente as palavras imprescindíveis, que eram dispostas numa coluna servindo para eventuais consultas. Aos poucos as frases eram ordenadas de acordo com a linha de discurso que se estabelecia na ocasião, e então se faziam as rimas. Por conta das rimas, algumas palavras eram alteradas e/ou trocadas. Por fim, apagava-se tudo do quadro e as frases eram depois dispostas em estrofes, geralmente de quatro frases. Como era uma atividade que requeria discussão e amadurecimento, os alunos eram solicitados a levar para casa o que tinha sido feito, para que pudessem estudar, complementar ou trazer sugestões que seriam consideradas no próximo encontro. Muitos alunos traziam novas palavras, novas frases ou davam idéias para melhorar o que tinha sido elaborado. No encontro subseqüente tudo era discutido e se chegava, afinal, à letra da música, que no decorrer do processo poderia ser revista e alterada, pois ainda faltava juntá-la à parte melódica.
5) Criação da melodia: Feita a letra da música, os professores, um deles geralmente tocando pandeiro e outro violão, instigavam os alunos no sentido de criarem melodias (ou fragmentos melódicos) e cantarem lendo a letra criada, que se encontrava disposta no quadro-negro ou em suas anotações. Essa ação era realizada várias vezes durante o encontro, até que surgissem idéias melódicas que fossem do agrado de todos. No início era um balburdio generalizado e um caos sonoro, com brincadeiras e risos, pois os alunos, deliberadamente ou não, “desafinavam” em alto volume de som. Mas aos poucos as melodias se fundiam, pois um ouvia o outro e surgiam linhas melódicas mais definidas, que eram então gravadas pelos professores. Após o encontro, os professores escutavam a gravação e selecionavam as melodias que se sobressaíam do ponto de vista da construção rítmica e melódica, originalidade, adequação à proposta e prosódia musical. Na aula seguinte, apresentavam as melodias, tocando-as na flauta (doce ou transversa), no violão ou cantarolando, e o grupo todo concluía esta etapa da atividade. No entanto, à medida que os alunos aprendiam a música – letra e melodia – havia modificações, pois dependia ainda da extensão dos cantores – fosse o coral ou poucos cantores –, da interpretação do solista, do andamento, do nível de dificuldade e de outros fatores.
6) Junção da música com o ritmo: Pronta a letra e a melodia da música, poucos instrumentos de percussão eram entregues aos alunos mais experientes[68], que, juntamente com a execução instrumental dos professores – violão, cavaquinho, teclado, flauta e/ou pandeiro –, iniciavam um laboratório do ritmo temático em questão, acompanhando o grande coro presente na sala. Era pedido que todos cantassem a música, independentemente de fazerem parte do coral ou não, pois era preponderante aprender e entender o que executariam em suas respectivas áreas de atuação nas oficinas, fosse cantando, tocando algum instrumento musical ou mesmo dançando.
7) Finalização: Depois de pronta a música, esta era trabalhada nas respectivas oficinas, sendo que na oficina de coral trabalhava-se a letra e a melodia, na de percussão trabalhava-se o ritmo, e na oficina de violão, a parte harmônica. Por fim, eram marcados ensaios com todos os envolvidos na quadra da Escola para se montar o grande grupo (orquestra), o que geralmente acontecia às terças-feiras a partir do segundo semestre, perto do final da aula do turno da tarde, ou aos sábados, na parte da manhã.

Todas as etapas vistas anteriormente tiveram como ponto de partida as atividades temáticas que norteavam o trabalho das Oficinas de Música e Dança, previamente traçadas pela equipe de professores e também sugeridas pelos alunos, que as indicavam durante as aulas. Foi o caso do samba, que gerou a música “Samba do lápis e caderno no compasso” e o funk[69], que desencadeou a música “Turma do gueto”.




CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa teve como propósito maior procurar entender e trazer à tona os processos de ensino-aprendizagem musical que estiveram presentes no trabalho desenvolvido na Escola Municipal Barão de Santa Margarida. Para tanto, se embrenhou em questões que permeiam a música e a Educação.
Antes de ingressar na escola o educando já dispõe de uma identidade cultural e conseqüentemente, de uma bagagem musical relevante, dadas as conexões que se estabelecem continuamente com o seu meio e ao longo de suas experiências de vida. Acontece no engajamento familiar, no círculo de amigos, nas práticas sociais, ou mesmo como ouvinte do conglomerado gerado pelos meios de comunicação, que estão cada vez mais presentes devido, sobretudo, à popularização e o consumo de tecnologias que propiciam rapidez na troca de informações e dados.
Diferentes concepções e expressões culturais são assimiladas e identificadas. Outras, todavia, são descartadas instantaneamente. Não que a tecnologia e seus produtos ditem agora os rumos da Educação. Mas eles entram, sim, como mais um elemento a participar da construção do conhecimento e de concepções estéticas. Como negar o rádio, a TV, a internet e os aparelhos digitais incorporados à vida de todos nós, inclusive do educando?
Na escola, por outro lado, este aprendente pode repensar e estruturar um senso musical mais elaborado, contextualizado, direcionado a um propósito específico e relacionado às áreas do conhecimento que o cercam neste ambiente propício. Através de atividades artístico-pedagógicas, de propostas interdisciplinares, ou mesmo pelo link que se estabelece na troca de informações constantes, isso acaba acontecendo e incidindo diretamente na Educação e na aprendizagem musical.
Ao compor um texto musical que partiu de um estudo histórico, por exemplo, o aluno estará adentrando nas disciplinas de Português e de História, simultaneamente. Por outro lado, ao desenvolver-se na leitura e produção textual nas aulas de Português e Francês, poderá repassar este aprendizado quando da elaboração de uma letra de música. Todavia, se não for bem conduzido, este enlace poderá se tornar ineficaz.
Aproveitando e partindo de sua pré-experiência musical e cultural, como as que observamos no grupo pesquisado, a escola pode instigar o aluno a conhecer e vivenciar novas compreensões musicais, alargando seu universo cultural e ajudando-o a perceber/conhecer parte da diversidade e pluralidade cultural. O importante é que a escola, seu novo reduto cultural, possa garantir-lhe um espaço para vivenciar e compartilhar práticas musicais distintas, seja ele possuidor de uma habilidade musical ou não.
Claro que não é papel do Ensino Fundamental formar profissionais, em qualquer área que seja. Mas, colocando de um modo geral, o objetivo da escola é preparar o cidadão para o futuro, dando-lhe subsídios necessários para adentrar em um mercado de trabalho cada vez mais especializado, precoce e concorrido. Por que não apoiar o aluno que já demonstra aptidão e interesse, ainda que nesta etapa escolar? Fazer o quê? Descartá-lo? Certamente, o mais importante é garantir um espaço para que se dê continuidade às habilidades artístico-musicais, sejam elas trazidas pelos alunos ou adquiridas na própria escola, fomentadas a partir de práticas bem conduzidas.
O trabalho de música da Barão mostrou que não se pode descartar ou desprezar esse contingente. Pelo contrário. Esses alunos têm que ser considerados, ouvidos e incluídos na vida da escola, pois incentivados poderão melhorar (continuar) e contribuir ainda para a musicalização de outros tantos. Porém, muitos alunos que possuem uma boa desenvoltura musical passam pela escola regular despercebidamente. Também se ressente dessa falta de apoio à área musical um expressivo contingente que tem interesse, mas não encontra condições para se iniciar e desenvolver essa prática.
Constata-se que continuamente talentos são desperdiçados, pois, devido à carência de espaço e ambiente motivador, acabam por desistir da música. Perde com isso a escola, e principalmente o aluno, que poderia crescer musicalmente e ser direcionado, quem sabe, para investir em uma futura carreira profissional. Carreira, caso seja de seu interesse, que não pode ser apresentada somente na fase adulta, tardiamente.
A iniciação musical deve ser trabalhada o quanto antes, para que se prepare um bom profissional da música, propensão que desponta muitas vezes na adolescência e um pouco depois desta fase. É comum hoje em dia ver músicos bem jovens em orquestras, bandas e grupos musicais, atuando plenamente.
Na Barão foram identificados alunos com boa habilidade musical. Parte dispunha de uma base musical satisfatória, e outra a desenvolveu nas aulas e na troca de experiências exatamente com aqueles alunos já iniciados, além das aulas com os professores e das dinâmicas desenvolvidas: aprendizagem de instrumentos musicais e canto, audições e vivência de gêneros musicais diversificados, prática de conjunto, passeios culturais, shows didáticos e festivais de música que os alunos tiveram a oportunidade de assistir ou em que puderam contracenar.
Alunos envolvidos no projeto de música da Barão readquiriram autoconfiança e iniciativa em suas atividades pedagógicas de um modo geral, e não somente musical. A música teve um efeito contaminador benéfico, pois favoreceu o desenvolvimento de atitudes de presença, frente aos desafios superados.
O educando da Barão, residente em um bairro da periferia carioca, após ter podido compartilhar “seu” funk, hip hop e pagode, se permitiu mergulhar no maracatu pernambucano, no bumba-meu-boi maranhense e no jongo fluminense, práticas bem distantes de sua realidade até então, quando foi motivado, quando percebeu o rico universo cultural devido à prática em que esteve imerso e, sobretudo, devido às respostas desencadeadas por sua dedicação e doação.
O estresse, legado da vida moderna e atribulada, é um dos principais fatores a prejudicar a desenvoltura dos alunos. Estes vivenciam a rotina de seus responsáveis, que se ausentam devido à lida intensa, e sentem ainda profunda insegurança em virtude da violência urbana. Por conta disso, irrompem manifestações de natureza psicológica e física. Nota-se ansiedade, dispersão, comportamentos agressivos e problemas que incidem diretamente na aprendizagem e nos relacionamentos. Na oficina de percussão, os alunos tiveram a oportunidade de extravasar pelo menos parte desse estresse acumulado, pois o ritmo é forte (que pode ser sentido), o som produzido é cativante e o resultado os atingiu rapidamente, dando uma resposta direta às suas experimentações.
E todas as oficinas propiciaram um convívio saudável e de interesse à ajuda mútua. Os que antes apresentavam comportamento agressivo, que eram faltosos ou que apresentavam conceitos baixos, melhoraram devido às mudanças que eles mesmos fizeram em suas vidas, fato por nós observado nos quatro anos, comprovado por esta pesquisa e ratificado pelos próprios alunos e professores entrevistados.
As composições musicais trouxeram, além de bons resultados musicais como os relatados no Capítulo 3, a possibilidade de os alunos exteriorizarem seus pensamentos, e isto não apenas no âmbito musical. Então, eles tiveram a oportunidade se comunicar com a sociedade, com a comunidade local, com a Escola e com eles mesmos. Constatou-se ainda a relevância dessa prática na Educação Musical, pois permite que o educando internalize conceitos musicais e expanda sua aprendizagem, principalmente se concatenada ao seu cotidiano.
O preconceito racial, religioso e social foi naturalmente levantado e discutido pelos envolvidos, fazendo com que percebessem as diferenças, semelhanças e pluralidade cultural. Alguns desses resultados se materializaram em canções de teor verossímil ou meramente poético, desenvolvidas nas atividades temáticas. Mesmo que em palavras musicais, suas músicas ecoaram de forma marcante na Escola e inclusive neles, pois quando se fala também se ouve/escuta. Sendo assim, tiveram que refletir sobre o que apregoavam, internalizando preceitos socioeducativos.
Na Barão, revelou-se a capacidade criadora, autônoma e articuladora dos envolvidos, inclusive dos alunos de rendimento insatisfatório tanto no que se refere à cognição como à conduta. Amparados e incentivados no projeto de música e dança puderam reverter a situação em que se encontravam e melhoraram significativamente. Mesmo que ainda com alguma dificuldade, como déficit de aprendizagem – de natureza congênita ou adquirida –, foram capazes de produzir algo significante, ajudando-os, assim, na longa jornada pela qual passaram e que ainda terão que percorrer. A socialização e a elevação da auto-estima, neste momento, foram ganhos consideráveis para aqueles que talvez tivessem como desfecho a reprovação inerente e, o que é pior, o abandono dos estudos devido a dificuldades, desmotivação e rejeição.
O projeto de música não resolveu todas estas questões. Certamente não poderia fazê-lo, nem era este o propósito principal. Mas colaborou no processo e, o que é mais importante, deu indicativos de um outro olhar para os alunos, que demonstraram ser capazes de surpreender quando lhes é dada uma oportunidade e algum tipo de amparo pedagógico. Devemos ter em mente que a escola deve ser um espaço para auxiliar o indivíduo para a transformação. Este não deve mais ser visto como incapaz, ao contrário. Deve ser preparado e incentivado a ser o sujeito de suas próprias transformações.
Quando os professores planejaram as atividades para as Oficinas de Música, estabeleceram o processo de avaliação como algo contínuo. A cada passo, estiveram atentos às respostas dos seus alunos. E nesse trajeto, mesmo os equívocos renderam aprendizados coletivos, porque caminhar junto é humanizar-se no processo. Certamente, falhas ocorreram, como em todo processo em construção, mas na medida do possível foram dirimidas ou serviram para suscitar idéias e melhorar o trabalho.
Avaliar pressupõe organizar a campanha. Não se seguiu aleatoriamente na jornada. Ao contrário, os professores decidiam sempre dialogicamente sobre o que seria importante nos diferentes trajetos adotados e, com unicidade, escolhia-se o mais adequado e a melhor ação aplicável à ocasião e às condições disponíveis: trabalho de equipe.
Alguns professores de outras disciplinas, que antes estavam desanimados e sem interesse, se organizaram em projetos interdisciplinares e mobilizadores, como os que foram relatados nesta pesquisa. Houve, em conseqüência, um expressivo progresso no relacionamento professor-aluno. Despontaram talentos entre o corpo docente, que guardava em seu bojo músicos e compositores que tinham abandonado esta prática, e que contribuíram ainda mais para o desenvolvimento do grupo de música.
A interdisciplinaridade surgiu. Não porque foi imposta, mas porque teve algum sentido e rumo. Também não houve imposição de participação: participou quem queria contribuir, integrar-se e quem concordava com as idéias propostas, tanto por parte dos alunos como dos docentes e funcionários, resultando na união da Escola e, como conseqüência, em benefícios para todos, para o coletivo.
Educar exige perspectivas de futuro. O aluno só aprende aquilo em que vê significado e, de algum modo, lhe traz prazer. Por esse motivo, obteve-se um resultado satisfatório no trato com o grupo. Observou-se em muitos alunos uma melhora no seu desempenho em relação aos outros componentes curriculares, bem como em suas relações interpessoais. Vínculos de amizade e companheirismo se estabeleceram e muitas das dificuldades foram superadas. Além do desempenho musical, alunos melhoraram tanto na Escola como na família, que passou a se orgulhar deles, ao mesmo tempo em que passaram a reconhecer e validar a Escola.
Além dos familiares dos alunos, membros legítimos da comunidade, moradores do bairro também tiveram acesso ao trabalho realizado em sua escola assistindo as apresentações dentro dela e nos arredores, participando de atividades promovidas pelas oficinas e participando de apresentações musicais, como foi o caso do sanfoneiro que residia em frente à Barão e que interagiu com o grupo.
A música instiga o educando – como curioso e sedento em aprender que é – a experimentar e criar, ajudando-o a formular pensamentos e ações imprescindíveis à sua formação. Pensar em música enquanto movimento artístico dinâmico e social é se aperceber do riquíssimo universo sonoro-musical, propulsor de novos caminhos, de novos paradigmas: educacional, mas também social e científico. Nesse trânsito, a pós-modernidade se assenta e nos invoca a uma via dupla de troca de saberes e culturas.
Quanto mais dialógica, democrática, prazerosa e participativa for a caminhada, mais se contribui para a mudança e melhoria da escola, da Educação e do grupo social em que a instituição se insere. Com isso, cada vez mais, diminuem as diferenças entre um bom discurso e uma boa prática.
E a Barão se fez presente ainda na sua comunidade, não somente no acompanhamento constante dos alunos e repassando dados e informações importantes aos seus devidos tutores, membros ativos dessa comunidade, mas também devolvendo um produto que foi gerado pelos seus próprios protagonistas – os alunos e professores – e que foi possível ser conferido e contemplado por todos.
As oficinas tiveram sua relevância por propiciarem oportunidades ao educando e por reconhecerem e aproveitarem suas potencialidades, suas competências, estimulando-o a criar, a participar, permitindo que desenvolvesse seu senso crítico, assumir-se como sujeito responsável pela sua própria transformação e do seu meio, além de outros aspectos que foram abordados, exemplificados e refletidos anteriormente. Vale também a aplicabilidade deste processo na formação do cidadão.
Devido às experiências vivenciadas, abriu caminhos para sua participação, autonomia, consciência crítica, busca de conhecimentos (também autoconhecimento) e inserção em um universo instigante de possibilidades inesgotáveis; criou novos e estimulantes horizontes para aqueles que realmente estavam dispostos a adentrá-los; e contribuiu para uma transformação pessoal e melhoria da qualidade de vida das pessoas envolvidas na Escola e com a Escola. Entrou tanto pelo lado artístico como pelos ideais didáticos, da forma mais abrangente possível: o artístico, o intelectual, o psicológico e o físico, todos juntos a serviço da construção do cidadão, conseqüentemente da cidadania, aspirações da Nova Educação.
Conclui-se, então, que o ensino de música na Escola Municipal Barão de Santa Margarida esteve imerso nas questões levantadas nesta pesquisa, sobretudo no ato de considerar o universo do educando.
Os resultados aqui relatados e discutidos foram, indubitavelmente, satisfatórios. Não só pelos produtos gerados, mas certamente pela mobilização de uma escola e pela valorização dos seus alunos, motivo disso tudo, inclusive desta pesquisa, que é ainda o registro cabal de um projeto de música nascido de um organismo vivo.
A partir das reflexões fomentadas ao longo deste estudo, futuras pesquisas poderão suscitar novas frentes de discussão ou ainda ser elaboradas voltando-se para os aspectos levantados, principalmente o ensino da música na escola regular através do desenvolvimento de projetos que guardem similaridades com as práticas apresentadas.
Dessa forma, considerar o educando e o meio cultural em que esteja inserido, atentar para o seu cotidiano, conduzi-lo à autonomia, permitir que tenha voz no espaço escolar, procurar entender seus processos de maturação e de aprendizagem, respeitá-lo, aproveitar suas potencialidades, enxergar suas outras competências – e não somente as que são verificadas através de provas, notas e conceitos formais – e valorizá-lo são ações que merecem atenção e respaldo no processo educacional do novo milênio.
No âmbito da Educação Musical – entenda-se também iniciativas e projetos musicais no espaço escolar promovidos por professores da disciplina –, é possível estimular o aluno à composição musical e se reportar a encaminhamentos musicais de prática musical em conjunto, quer tenham um aparato instrumental ou se promovam simplesmente pelo viés criativo do educando e do educador, que tem como desfecho a atuação conjunta desses agentes indissociáveis, pois um se valida do outro para existir e evoluir.



Notas


[1] Defendida em agosto de 2008 na Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sob a orientação da Profª. Doutora Ermelinda Azevedo Paz. Título: O ensino de música na Escola Municipal Barão de Santa Margarida: um estudo de caso.
[2] Onde fui professor de Educação Musical por sete anos, entre 2002 e 2008. A Barão localiza-se no bairro de Santa Margarida, Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, e  é uma subdivisão do bairro de Campo Grande. Foi inaugurada em 3 de dezembro de 1970. A área que hoje abriga a instituição foi doada à comunidade para suprir a falta de escolas na região. Há no entorno pequenas atividades comerciais, além de algumas indústrias, doze associações de moradores, um posto policial, dois postos de saúde da Prefeitura e dezenas de entidades religiosas que atuam no bairro. A escola está vinculada à Rede Municipal de Ensino da cidade do Rio de Janeiro, subordinada à Secretaria Municipal de Educação (SME) e à 9ª Coordenadoria Regional de Educação (9ª CRE).
[3] a) A Constituição Brasileira, Art. 205, diz: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1999, p. 120).
b) “A escola pública não pode deixar de ser uma obrigação do Estado democrático e, como tal, um lugar de investimento prioritário, quer em termos de orçamento, quer em termos de recursos materiais e humanos, quer ainda no que diz respeito à formação inicial e contínua de professores e educadores” (AFONSO, 2001, p. 86).
c) Para políticas públicas na Educação Musical, cf.
6/CDROM/COM/01_Com_EdMus/sessao05/01COM_EdMus_0504-089.pdf>.
[4] Depoimento concedido em maio de 2008.
[5] Essas colocações foram tiradas de conversas com professores, em discussões acontecidas nos Conselhos de Classe e trabalho nas oficinas da Barão e, principalmente, de nossa experiência como docente e músico profissional.
[6] Além do trabalho musical, desenvolviam-se também nas oficinas atividades de artes plásticas (desenhos e grafitagem), dança e, por um breve período, teatro.
[7] FECEM (Festival da Canção das Escolas Municipais)  é um festival de música que acontece todo o ano na Rede Municipal de Educação do Rio de Janeiro e, em 2007, realizou sua 17ª edição. A Barão participa desde 2002, e nesse tempo, logrou 1º lugar em cinco deles, na etapa regional da 9ª Coordenadoria Regional de Educação (9ª CRE).
[8] Ex-professora de Educação Musical da Rede Municipal que atua na SME/DEF/Música.
[9] Depoimento concedido em 30/08/2005.
[10] Realizado em 20 de outubro no Teatro Odylo Costa Filho, espaço que se integra ao complexo do campus da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), no bairro do Maracanã.
[11] Instrumento de percussão de origem afro-cubano, variante do atabaque, muito usado na música latina. Também é uma “Dança de salão de origem afro-cubana” (SADIE, 1994, p. 214).
[12] Também no teatro da UERJ. A apresentação do aluno aconteceu de forma inesperada, pois a abertura do Festival seria com uma gravação do hino. Ao tomar conhecimento do aluno um dia antes do evento no ensaio geral, a organização fez o convite através de um dos professores das oficinas da Escola.
[13] Pauta musical, clave de sol, figuras de ritmo (som e silêncio), notas musicais (dó3 ao dó5), compassos simples e cifragem musical. Este último item para os alunos de instrumentos harmônicos.
[14] Cf. CIAVATTA, Lucas. O passo: a pulsação e o ensino-aprendizagem de ritmos. Rio de Janeiro: L. Ciavatta, 2003.
[15] Cf. Seção 3.3.4.2.
[16] Segundo Edison Carneiro (1961, p. 5), “Não há, presentemente, uma palavra de aceitação universal para designar, em conjunto, as danças populares nacionais – tecnicamente, bailes – derivadas do batuque africano”. E a profª. Regina Meirelles Santos (2003, p. 109), comenta: “Quando sambistas falam de ‘samba de raiz’, muitas vezes, mesmo sem saber, estão falando de formas, estilos e gêneros musicais que ficaram impressos no samba e remontam às práticas antigas de cantos e danças africanas em território nacional”.
[17] “Os batuques, nome aplicado sempre com sentido genérico a todos os ritmos produzidos por negros à base de percussão, começaram a preocupar os dirigentes da Colônia [...] quando se começou a chamar a atenção, a partir dos últimos anos dos 1700, para o caráter muitas vezes religioso de tais manifestações dos negros” (TINHORÃO, 1972, p. 129).
[18] O espaço de música foi conseguido um pouco depois do início do projeto. No entanto, era bem menor, em relação às salas de aula comuns e ainda servia para guardar todo o material de música.
[19] Os valores são aproximados, pois havia rotatividade no ingresso e saída de participantes do projeto. Dados fornecidos pelos professores das oficinas em maio de 2008.
[20] Depoimento concedido em 01/05/2008.
[21] Tipos de palhaços do bumba-meu-boi maranhense.
[22] O professor também realizou um trabalho de hip hop dentro de sua sala de aula, onde foi produzido um vasto material (trabalhos de pesquisa, cartazes, grafitagens e letras de músicas), além da abertura de discussões sobre temas pertinentes como a cultura afro-brasileira, preconceito racial, entre outros.
[23] O professor, que é exímio desenhista e leciona Matemática, freqüentemente fazia charges na Barão, principalmente das Reuniões Pedagógicas e Conselhos de Classe.
[24] Tinha como proposta desenvolver “atividades interdisciplinares”, proporcionar um ensino de qualidade, provocar “a curiosidade e investigação científica, de forma interativa, lúdica, desenvolvendo no aluno a criatividade, percepção e crítica reflexiva”. Propõe ainda promover em seu corpo discente a “formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização e preparação para o exercício consciente da cidadania, e inclusão no mercado de trabalho e na sociedade” (ESCOLA MUNICIPAL BARÃO DE SANTA MARGARIDA, 2006).
[25] Linha teórica organizacional da didática da escola que surgiu no início do século XX com John Dewey. No Brasil foi implementada por Anísio Teixeira na década de 1960 (ZUBEN, 2001).
[26] No entanto, procurava-se estimular os alunos no sentido de melhorarem no desempenho escolar. Mas não perdiam a vaga caso apresentassem dificuldades. A não ser as notas baixas pelo número elevado de faltas.
[27] Que era acordado entre os professores das oficinas e que variava dependendo da gravidade do ocorrido.
[28] Maria Manoela Faleiro e Rosane Medeiros.
[29] Depoimento concedido em 13/12/2007.
[30] Depoimento concedido em 13/12/2007.
[31] FECEMs de 2002 e 2003.
[32] 1º lugar nos dois anos seguidos na Etapa Regional.
[33] O aval foi dado pela diretora da Escola, profª. Catia de Freitas. Mas é pertinente salientar que a diretora da gestão anterior, profª. Márcia Pascoal, apoiava as iniciativas dos professores de Música e participava com entusiasmo das discussões para a criação das oficinas. No entanto, sua sucessora é que concretizou o projeto, pois dependia também de aval da 9ª CRE.
[34] Músico profissional, saxofonista, flautista, compositor, arranjador e produtor musical.
[35] Músico profissional, violonista e compositor.
[36] Música prática. Estudou bateria com músicos profissionais e nas Oficinas da Barão aperfeiçoou sua técnica em instrumentos de percussão diversos.
[37] O professor é membro permanente da ala dos compositores da G.R.E.S. Unidos da Tijuca. Em 2004 trabalhou com alguns alunos das oficinas na elaboração do samba-enredo Universo feminino na história da humanidade, que foi cantado no mesmo ano no desfile da Escola de Samba Corações Unidos do Ciep, na Sapucaí. O desfile acontece sempre na sexta-feira de Carnaval e participam escolas-mirins de agremiações do Rio de Janeiro e da Rede Municipal de Educação. Cf. . Acesso em: 2 maio 2008.
[38] Professor de Educação Musical. É músico profissional, toca violino, violão e trompete.
[39] Professor de Teatro e ator profissional.
[40] Dados fornecidos pelos professores das oficinas em março de 2008.
[41] Após o período de férias escolares e antes do início das aulas, geralmente no mês de fevereiro, os professores se apresentam. Nesses encontros, há reuniões de planejamento, informes pertinentes ao período escolar que se inicia e preparação das salas e dos materiais que serão utilizados.
[42] Músicas com apelos à violência e ao sexo. Geralmente são mídias “piratas”, copiadas ilegalmente ou comercializadas no mercado paralelo.
[43] Não é um gênero musical, e sim um termo que engloba vários gêneros musicais nordestinos, como o baião, coco, xote e marcha junina.
[44] Temas propostos: disfunções comportamentais; direitos e deveres; doenças degenerativas; drogas; clonagem, trangênicos e genoma; educação ambiental (lixo e reciclagem); identidade; preconceito; preservação da família; sexualidade, doenças sexualmente transmissíveis; recursos tecnológicos; violência (ESCOLA MUNICIPAL BARÃO DE SANTA MARGARIDA, 2006).
[45] Conversaram informalmente com o violinista André Cunha sobre o concerto, perguntaram sobre o instrumento, sobre o Theatro Municipal, sobre a Orquestra. O músico tocava também no grupo Sembatuta, juntamente com um dos professores das oficinas.
[46] Local de coleta para reciclagem de lixo urbano. Parceria entre a comunidade e administração pública.
[47] Ritmo presente em muitos grupos da Bahia, como o Olodum e Timbalada.
[48] Festival de dança que acontece todo ano na Rede Municipal de Educação.
[49] A Sra. Therezinha Leite de Souza, ou Dona Therezinha como todos a conhecem, reside na Barão há doze anos. Participou ativamente das atividades desenvolvidas nas oficinas desde o início, hora fazendo parte do coral, hora dançando ou então ajudando na manutenção da sala de música e no manejo dos alunos nas apresentações e passeios. Também ministrou aulas de bordado, crochê e bijuteria em eventos interativos destinados à comunidade escolar.
[50] Residia em frente à Escola. Praticamente toda a tarde ficava sentado na calçada, tocando sua sanfona. Numa dessas tardes, os professores das oficinas o convidaram para participar de uma apresentação musical.
[51] Primeiro lugar na escolha do samba enredo-mirim, evento vinculado à Rede Municipal de Educação.
[52] Faculdade da Zona Oeste do Rio de Janeiro.
[53] Complexo de São Cristóvão.
[54] Em 21/10/2004.
[55] Professores e funcionários da Barão: Alcir da Silva, Aline da Silva, Ângelo Soares, Arilda da Silva, Carlos Eduardo, Catia de Freitas, Dilma Barrozo, Dilmara Cardoso, Dudu Azevedo, Elder Sodré, Eliane Gaspar, Elizabeth Rosa, Fabíola Lopes, Fátima Souza, Flaviano Noronha, Geber Almeida, Gilmar de Oliveira, Guilherme Degou, Heloisa Viana, Inês Paulino, Ivanilda dos Santos, Ivonete Oliveira, Joel Camilo, Jorge de Assis, José Américo, José Antenor, Jussara Amador, Manoela Faleiro, Marta Jesuíno, Ramalho Silva, Régia do Nascimento, Rejane Cruz, Rita de Cássia, Rosana Carvalho, Sandra Moreira, Sérgio Ferreira, Sirlei Citarella, Sônia Regina, Suzana Carvalho, Therezinha Leite, Vera Costa e Vilma Gararoba. Assim como os demais professores da Barão, o prof. Geber Almeida, Coordenador de Eventos da 9ª CRE à época, apoiou substancialmente o trabalho das Oficinas da Barão.
[56] Era como os alunos se referiam também à música Boi da paz.
[57] Dia de Arte da Barão, realizado em 07/12/2004.
[58] Depoimento concedido em 01/05/2008.
[59] Depoimento concedido em 08/06/2008.
[60] Cf. Acesso em: 5 maio 2008.
[61] Hip hop e bumba-meu-boi.
[62] Desconectado da internet. O material foi preparado pelos professores das oficinas e colocado em cada computador do laboratório para consultas e visitação dos alunos.
[63] Do FECEM  2002,  2003,  3004,  2005,  2007;  CD Samba Enredo das Escolas Mirins do Rio de Janeiro 2004.
[64] Programas produzidos pela MULTIRIO em 2004 e 2005.
[65] Atual Citibank Hall, localizado na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro. É a maior casa de espetáculos da América Latina.
[66] Professores das Oficinas da Barão, 2005.
[67] Os gêneros samba e hip hop partiram dos alunos e foram aproveitados pelos professores das oficinas para as atividades temáticas.
[68] Pois muitos instrumentos tocando juntos poderiam encobrir as vozes, no que se refere ao volume do som.
[69] Constantemente os alunos faziam batucadas, além de trazerem e apresentarem batidas diversificadas de funks para as oficinas, principalmente na de percussão.